domingo, 29 de janeiro de 2012

O mercado encolhe ainda mais

O mapa exploratório brasileiro mudou e tende a mudar ainda mais, caso o governo não realize novos leilões de áreas nos próximos anos, nem mesmo fora do cluster do pré-sal – que, aliás, foi descoberto em blocos de rodadas. Sem licitações offshore desde 2007 e com as várias pendências no novo marco regulatório, o Brasil tem visto o clima de pujança oriundo do advento da descoberta do pré-sal de Santos, em 2006, dar lugar a um cenário opaco, marcado pela desaceleração dos investimentos de operadores. Os últimos anos têm registrado a saída de algumas petroleiras, sobretudo as independentes estrangeiras, uma significativa redução da área sob concessão e a mudança do perfil da atividade exploratória no país.
De polo promissor de novos negócios, o país está sendo aos poucos excluído do calendário mundial de novos leilões e incluído no rol dos países sem previsibilidade de expansão. Em vez de alavancar novos investimentos e oportunidades de negócios, o pré-sal vem trazendo de volta o monopólio da Petrobras – não de direito, mas de fato.
Não faltam sinais dos novos tempos, tampouco muitos alertas à situação. Sem novos leilões, por exemplo, a projeção é de que a área sob concessão seja reduzida para menos da metade do início de 2011 já em 2012. 
E para se ter ideia do quanto o país tem se afastado do circuito dos novos negócios para petroleiras, o Brasil e o pré-sal não foram o tema central do último WPC, importante evento do setor petróleo mundial, realizado no Catar no início de dezembro. Áreas como as águas profundas da Venezuela e a costa oeste da África – e até mesmo as bacias terrestres da Argentina – ganharam mais destaque quando os assuntos apontavam para novas oportunidades de investimento pela indústria internacional.
Nada no CNPE
Entre os próprios órgãos de governo pouco se tem ouvido falar sobre a 11a rodada da ANP. Na última reunião do CNPE, realizada em 5 de dezembro, nenhum tema relacionado ao segmento de petróleo foi discutido ou sequer mencionado.
O secretário de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços do Rio de Janeiro, Júlio Bueno, credita esses problemas ao novo marco regulatório do petróleo. “A situação é absolutamente preocupante, tendo em vista a redução das áreas concedidas, a parada do setor petróleo no Brasil, a saída das empresas. Ninguém mais enxerga o que vai acontecer”, afirma ele. 
A visão comum a especialistas e executivos do setor é de que a discussão do pré-sal deveria ser conduzida à parte, sem comprometer as conquistas dos 14 anos de abertura do mercado. Entre dar atenção especial ao pré-sal e paralisar um processo reconhecido internacionalmente como bem sucedido há uma distância tão grande quanto a que separa planejar o desenvolvimento e travar o crescimento.
Na visão de um executivo de uma multinacional, o país tornou-se menos amigável às petroleiras. Para ele o cenário é indefinido, e as empresas terão que somá-lo às incertezas normais da exploração. 
O pré-sal é um concentrador de riqueza e seu desenvolvimento e exploração caberá a poucas e grandes empresas, entre petroleiras e fornecedores de bens e serviços. Além do mais, os 149 mil km² da fronteira representam apenas 2,3% da área sedimentar brasileira.
O pior ano pós-abertura
Indicadores da ANP e da indústria alertam que, sem a 11a rodada em 2012, a área sob exploração no país irá despencar dos atuais 300 mil km², medidos no fim do ano passado – apenas 4,15% da bacia sedimentar do país –, para cerca de 115 mil km², considerando o vencimento de alguns prazos exploratórios em vigor. Se isso se confirmar, será a menor área sob concessão desde a abertura do setor, que chegou a ter quase 450 mil km² exploratórios em 2000.
Não bastasse a redução drástica, as estimativas são de que quase 40% das áreas remanescentes no fim deste ano serão oriundas da 10a rodada, que ofertou apenas blocos terrestres, geralmente com potencial de descoberta mais baixo que os marítimos. Sem novos blocos, a atividade exploratória offshore ficará restrita a áreas das 6ª, 7ª e 9ª rodadas.
A situação só não é pior, dizem os analistas, porque muitos blocos sob concessão hoje tiveram seus prazos exploratórios estendidos pela ANP em 2005, em função da escassez de sondas para perfuração ou de dificuldades no licenciamento. Na ocasião, o programa de trabalho do segundo período de todos os blocos de águas rasas foi ampliado de um ano para dois anos, postergando o vencimento de diversos compromissos.
Embora o impacto maior comece neste ano, o estrago com a interrupção dos leilões vem desde 2009, o primeiro ano sem rodada. Naquela época, a área exploratória sob concessão no Brasil totalizava quase 350 mil km². 
Os cerca de 300 mil km2 sob concessão no fim de 2011 estão distribuídos por 322 áreas. A maior parte delas é offshore – 173. As outras 149 são áreas terrestres maduras e de nova fronteira.
Redução ainda maior
Indo além de 2012 as consequências são ainda mais devastadoras. Em 2014, mantido esse cenário, a área sob concessão ficará restrita a blocos das 9ª e 10ª rodadas, que, juntos, somarão parcos 49,1 mil km², uma área menor que a do Rio Grande do Norte ou pouco mais que duas vezes a área de Sergipe.
Em 2015, o Brasil entraria em situação de quase paralisação. Os indicadores projetam 8,6 mil km², todos de blocos da 10a rodada, que não chegam a duas vezes a área do Distrito Federal, de 5,8 mil km². Em 2016, as projeções indicam que devam estar sob concessão apenas três planos de avaliação e dois a três blocos exploratórios da Bacia do Solimões.
É verdade que, pela quantidade de recursos a ser demandada em desenvolvimento e avaliação das áreas já concedidas do pré-sal, o volume geral de investimentos não deverá cair. Contudo, nesse ritmo de descontinuidade, o país vai arrecadar menos do que poderia se o governo mantivesse a oferta de blocos nas demais áreas.
Ação e reação
Assim, contido pela falta de novas ofertas – hoje restritas a poucas e já caras operações de farm-out –, o mercado assiste à diminuição do número de petroleiras com investimento no Brasil e à mudança do perfil dos investidores. O país, que chegou a abrigar quase 80 empresas nacionais e estrangeiras em exploração, hoje conta 60 companhias de petróleo, sendo 37 como operadoras e 23 na condição de sócias. 
A quebra do ritmo afetou em cheio o interesse das companhias estrangeiras independentes, que demonstravam grande apetite e angariavam portfólios expressivos, alguns já com descoberta e produção garantidas. Com menos resistência ao risco e mais suscetíveis a variações que ameacem suas rentabilidades regionais, essas empresas estão optando por vender seus ativos brasileiros, seja para investir em outras regiões, seja para sanar contas de outros lugares. 
A lista de desistentes é representativa e não deve parar de crescer. Foi assim com a Devon, está sendo assim com a Anadarko. E sobre possíveis seguidores da debandada crescem boatos, não confirmados, de que ENI e, mais recentemente, a brasileira Vale, planejam deixar o setor.
Para os menos favoráveis à abertura do mercado, essa desistência pode ser vista como mais um indício da falta de compromisso dessas petrolerias com o país. O problema é que, independente da razão social e da nacionalidade de cada petroleira que decide encerrar atividades no Brasil, ficam pelo caminho empregos diretos e indiretos.
O que se tem feito, na avaliação de uma executiva do setor, é restringir a possibilidade de ingresso de pessoas no setor petróleo. “Diminuem a cada ano as chances de brasileiros trabalharem no setor.” 
Apesar dos pesares, não se pode negar que também surgiu um novo nicho de empresas brasileiras que enxergaram, através de seus executivos e criadores, uma oportunidade para crescer no próprio país. A lista inclui as conhecidas OGX, HRT e Petra e as novatas Barra Energia e YXC. Entretanto, sem leilões, também elas terão seu crescimento tolhido.
Sob essa incerteza em relação ao futuro, especialistas destacam que o Brasil se mantém atrativo a um grupo cada vez mais restrito de empresas. A atividade exploratória tende a se direcionar a grandes petroleiras estatais e privadas, que têm mais fôlego para o risco.
FONTE: Revista Brasil Energia

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